sábado, 5 de maio de 2012

Mente versus Cérebro


Visão geral

Um bom indicador para a divergência no meio científico em relação ao estudo da mente pode ser verificado ao se analisar as conclusões (gerais) resultantes dos que trataram do assunto na “Rumo a uma Base Científica para a Consciência”, em 1994, no Centro de Ciências Médicas da Universidade do Arizona, em Tucson. O evento teve cerca de trezentos participantes.
As conclusões sobre o assunto que foram lá apresentadas podem ser agrupadas, de forma genérica, em dois grandes conjuntos de concepção sobre o que é a mente: uma forma de campo, uma presença no cérebro; ou um mero processo cerebral, um efeito da atividade neste órgão (um epifenômeno). Talvez seja uma reedição da antiga “luta” que Descartes tentou apaziguar.
No caso do “campo” (mental), a consciência é tida como algo sem emendas, de certa uniformidade, mas com intensidade variável em formas de vidas distintas, ou, até, em estados de vigília diferentes. É tida no nível científico, como a psicologia o trata. É quase um mistério que habita no cérebro e nos permite toda a espécie de experiência subjetiva.
Os neurologistas preferem a interpretação de que a mente é um epifenômeno do cérebro, um uma atividade quase secundária - é como o vento em relação à atmosfera: a descrição de uma ação do meio. Para os que assim interpretam, é improcedente considerar a mente sem levar em conta o cérebro.
Outra patente diferença verificada na conferência de Tucson, nos termos de Christof Koch, foi a divergência de opiniões entre “físicos” e “biólogos”. Os primeiros acreditam que uma característica surpreendente e ainda não observada na natureza aclarará o fenômeno da consciência. Algo simples e contundente. Já os “biólogos” estão acostumados com interações múltiplas, uma gama de processos contribuindo na resultante.
Enfim, tratando-se de estudos sobre a consciência, pode-se afirmar que existem muitas divergências e que ainda estamos engatinhando no entendimento básico da natureza da mente.


Um artigo com incomuns interpretações de resultados


Há indício ou prova de que a mente exista independente das atividades neurais? Procuremos exceções à regra dominante e aceita no meio acadêmico, mas sem sair deste mesmo meio.
Não é de se esperar uma abundância de experiências e artigos que colimem em desacordo com o consenso de maioria. Isso ocorre devido a publicações que se chocam com paradigmas vigentes colocarem seus autores em situação delicada no meio científico, caso o artigo não tenha provas avassaladoras a favor do que é argumentado no mesmo.
O médico Pim van Lommel, cardiologista do Hospital Rijnstate, em Arnhem, Holanda, em conjunto com outros pesquisadores, apresenta um artigo [1] cuja temática e conclusão são raríssimas no meio científico pertinente: os autores descrevem a constatação de atividade mental em pessoas cujo sistema nervoso central estava desprovido de qualquer impulso nervoso detectável. A experiência publicada cita compilações de casos de doentes clinicamente mortos, entenda-se “sem impulsos nervosos mensuráveis”, que, após terem a consciência restaurada, traziam relatos do período em que eram considerados “mortos”. O cardiologista holandês (e equipe) deu um tratamento científico ao caso.
O médico Sam Parnia, do Hospital Geral de Southampton, no sul da Inglaterra, foi um dos chefes da pesquisa feita em 10 hospitais holandeses onde foram observadas 1500 pessoas das quais pelo menos 63 relataram a experiência da quase morte. Os pacientes observados ficaram de 15 segundos a 43 minutos clinicamente mortos.
O artigo [1] mostra relatos de atividades de diversas pessoas, nos hospitais em que estavam ou fora destes, no mesmo período em que os pacientes eram considerados clinicamente mortos. Supreendentemente, alguns dos fatos descritos, inclusive fora do hospital, puderam ser comprovados.
O trabalho em apreço foi fonte de alguns documentários. Em um destes, exibido pelo canal Discovery, o Dr Peter Ferwick, neurologista e neuropsiquiatra, nos afirma: “Numa parada cardíaca, monitorando o cérebro, verá que a atividade deste cessa em até 8 segundos, se desativa. A neurociência nos mostra que não há experiência sem função cerebral. Então, quando o cérebro para, toda experiência cessa. Se por algum motivo não cessar, podemos afirmar que a mente e o cérebro não são a mesma coisa”.
Dentre vários relatos, o mais impressionante é o de Pam Reynolds. Sobre o caso, o Dr Michael Sabom - Atlanta, Georgia, cardiologista, afirma: “Se fosse possível fazer uma experiência de laboratório em que se pudesse levar alguém ao limiar da morte, ou até mesmo a morte, e trazer essa pessoa de volta e perguntar do que se lembra, o caso de Pam Reynolds seria o mais próximo dessa experiência.” Pam Reynolds tinha um grande aneurisma cerebral. O primeiro neurologista que ela consultou não lhe deu esperança. Então, ela foi ao Barrow (ou Arrow) Neurological Institute. O Dr Robert Spetzler, neurocirurgião, contrariando os prognósticos, resolveu assumir o caso. Ele descreve a cirurgia como muito delicada, pois, para desenvolver a mesma foram necessários os seguintes procedimentos preliminares:
1.    a temperatura corporal da paciente foi reduzida, ficando entre 10ºC e 15ºC;
2.    o coração e a respiração foram parados; e
3.    sem função cerebral, todo o sangue foi retirado da sua cabeça.
Ela tinha de estar clinicamente morta durante toda a cirurgia. Antes desse “trauma”, o paciente é anestesiado, sua vista é coberta e dispositivos são colocados no seu ouvido para monitorar o cérebro. O paciente é completamente coberto, exceto o crânio, a área que sofrerá intervenção.
Hoje a Sra Reynolds afirma se recordar da preparação antes de entrar na sala. A próxima recordação dela é de um som gutural, como uma broca, e de sentir o topo da cabeça formigando. Em seguida ela relata costumeiros “efeitos especiais”, como luzes, sensação de leveza e paz. Sendo conservador, assumamos que esta parte do relato é explicável pela reação do organismo ao readquirir ou perder a consciência.
A coisa fica interessante quando a Sra Reynolds descreve os instrumentos, bastante incomuns e específicos, usados pela equipe cirúrgica em sua operação. Ela presumira que abririam seu crânio com “uma serra”, mas diz, espantadamente, que usaram algo similar a uma furadeira: descreve as brocas e caixa de ferramentas onde estas estavam guardadas. A pesquisa confirmou que se tratava de uma pequena serra circular, vista na documentação oficial da cirurgia e em foto, de estética similar à indicada pela paciente.
Ela afirma que uma das médicas falara que as artérias da Sra Reynolds eram pequenas: “Parecia que eles estavam mexendo muito embaixo. Eu lembro de pensar: o que estão fazendo? É uma cirurgia no cérebro. Eles iam retirar o sangue das artérias femurais. Não entendi isso”. Com precisão, ela relata a conversa entre os cirurgiões que iriam ligá-la à máquina “coração-pulmão”, dentre outras.
O Dr Michael confrontou o relato da Sra Reynolds com o relatório oficial da cirurgia. Existe uma correlação perfeita entre ambos. Existiam instrumentos que até o Dr Michael desconhecia, descritos pela paciente. Ele achou ridículo quando ela descreveu um instrumento como uma “escova elétrica”. Pediu uma foto para ver o material e, espantado, revelou que parecia mesmo com uma escova elétrica.
O Dr Spetzler não acha possível que ela tenha visto os instrumentos cirúrgicos na sala de cirurgia. Nas palavras do próprio: “A broca, por exemplo, estava guardada. Estava tudo coberto dentro das embalagens. Só abrimos as embalagens com o paciente dormindo para manter o ambiente estéril”. Sobre o que foi ouvido, ele afirma: “Nesse estado da operação ninguém pode ver ou ouvir coisa alguma, e me parece inconcebível que ela tenha ouvido. Fora isso, havia dispositivos em seus ouvidos. Seria impossível ela ouvir”. Declara ainda: “Não tenho explicação para o que aconteceu. Não sei como aconteceu, considerando o estado fisiológico dela. Mas já vi tantas coisas que não posso explicar. Não sou arrogante a ponto de dizer que não pode ter acontecido.”
O Dr Michael conclui, por esses fatos, que houve uma percepção extrassensorial, ou experiência extracorpórea.
O aludido artigo [1] traz:  How could a clear consciousness outside one's body be experienced at the moment that the brain no longer functions during a period of clinical death with flat EEG?”, em tradução livre: Como poderia uma consciência claramente fora do próprio corpo ser experimentada no momento em que o cérebro não funciona mais, durante um período de morte clínica com EEG plano? De onde se verifica que, para os autores do citado artigo, houve, de fato, uma experiência de consciência fora do corpo quando este não exibia sinais neurológicos detectáveis.
Para os fatos descritos naquela publicação científica, a teoria acadêmica vigente não tem resposta. Um único artigo é pouco para se tirar uma conclusão segura. Porém, ao se considerar que, naqueles casos tratados no citado artigo, é fato a permanência da percepção do “eu” mesmo sem qualquer atividade nervosa, tem-se uma conclusão: o cérebro não é a fonte que caracteriza a sensação do “eu”.
Se estendermos a citação de Stephen Hawking “Qualquer teoria física é sempre provisória, no sentido de ser apenas uma hipótese: nunca é possível prová-la. Não importa quantas vezes os resultados dos experimentos estejam de acordo com alguma teoria, você nunca poderá ter certeza de que, na próxima vez, o resultado não a contradirá. Por outro lado, você pode desacreditar uma teoria encontrando uma única observação que seja discordante de suas previsões.” à neurologia e, ainda, considerarmos como fato o descrito no artigo [1], as conclusões (ou parte delas) lá expressas, então o modelo de consenso estaria invalidado.


[1] van Lommel, P., van Wees, R., Meyers, V. and Elfferich, I.; Near-death experience in survivors of cardiac arrest: a prospective study in the Netherlands; Lancet 358, pag 2039-2045; 2001.

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