quarta-feira, 9 de maio de 2012

Interpretações da mecânica quântica



Introdução
Imagine que temos um dado, em perfeito equilíbrio, de seis faces numeradas de 1 a 6. Nestas condições, é fácil perceber que, para obter um dos seis números em um lançamento do dado, as chances são de uma em seis, ou seja, de 1/6 ou, aproximadamente, 16,7%.
Agora admita que vou manipular as chances nos lançamentos, “viciando” o dado (deixando-o desiquilibrado).
Minha primeira manipulação é dobrar as chances de obter o número 5 em relação aos demais.  Assim, em sete lançamentos, espera-se obter 1/7 (cerca de 14,3%) de chance para cada número diferente de 5 e, para este, 2/7 (cerca de 28,6%), ou seja, o dobro dos demais.
Minha segunda manipulação é fazer o número 6 ser obtido o dobro de vezes (em média) que o número 5. Isso equivale a direcionar os lançamentos de forma que (em média), em dez jogadas, os números de 1 a 4 saiam uma vez, o 5 saia duas vezes e o 6 saia quatro vezes. Tem-se, assim, chances de: 10% para os números de 1 a 4, 20% para o 5 e 40% para o 6.
De forma genérica, pode-se dizer que a densidade de probabilidade de se obter o número 6, com o dado viciado, é maior do que obter o cinco. De forma análoga, a densidade de probabilidade de se obter os números de 1 a 4 é menor do que os outros dois valores.
Digamos que vc esteja vendado enquanto o dado é lançado. Você pode ouvi-lo quicar na mesa, mas não imagina o valor que ele exibirá ao final do movimento. De certa forma, é como imaginar que todas as probabilidades de quaisquer das faces aparecerem corressem (ao menos em sua mente) paralelamente. Ao remover a venda, observando o dado, verá que todas as probabilidades das cinco faces “perdedoras” são, agora, de 0% e a face exibida, a “vencedora”, é 100%.
É claro que um observador desvendado verificou que o dado fez uma determinada trajetória que resultou na face vencedora. Se pudéssemos equacionar todos os fatores e variáveis que influenciam no lançamento e trajetória, poderíamos, teoricamente, calcular qual seria o número que o dado apresentaria ao fim do seu movimento. O tratamento estatístico, neste caso, é meramente devido às dificuldades práticas de equacionamento e cálculo. Neste caso, não é razoável ao senso comum supor que o dado faria, simultaneamente, todas as trajetórias possíveis e, após olharmos, somente uma seria efetivamente observada.
Contudo, na mecânica quântica, o comportamento é perturbador ao senso comum.
A partir do princípio da incerteza (W Heisenberg, 1927), verifica-se que não podemos medir posição e velocidade (na verdade, quantidade de movimento) com precisão absoluta, simultaneamente, para a mesma partícula em dado momento. A medição dessas grandezas é que permiti se estabelecer uma trajetória (como vemos o dado fazer).
Contudo, surge, aqui, uma discussão: é meramente uma barreira teórica e tecnológica, ou se, de fato, é um comportamento da natureza.

Medição e incerteza
Para se calcular um resultado na mecânica quântica, em dados experimentos, utiliza-se a equação de  Schrödinger. Ela nos permite quantificar a densidade de probabilidade das medições possíveis de serem obtidas, dando resultados, grosso modo, como as densidades de probabilidade de se obterem os números de 1 a 6 ao se lançar o dado. Só que, aqui, o lançamento do dado é sempre feito com o observador (o pesquisador) de “olhos vendados”: por se tratar de elementos muito pequenos, em geral bem abaixo da escala atômica, não os podemos ver, só calcular a probabilidade dos resultados. Mas, e se pudéssemos “ver”?
De acordo com a interpretação da mecânica quântica utilizada, pode-se defender que: a impossibilidade de determinar, por exemplo, a trajetória de um elétron é um comportamento inerente da matéria (ou seja, todas as trajetórias possíveis ocorrem simultaneamente, chamado de superposição [1]); ou, ainda, argumentar que se trata de mera limitação técnica.
Que há uma onda probabilística associada à medição, de uma forma direta ou não, não há dúvida. Essa certeza se origina empiricamente, como, por exemplo, o experimento da dupla fenda (animação).
Esta experiência ilustra o comportamento dual, partícula-onda, que ocorre com elementos sujeitos aos efeitos verificados no nível da mecânica quântica, chamados aqui de objetos quântico. Tais comportamentos específicos não são desconhecidos no “mundo clássico”.
Mas a equação de Schrödinger é mera descrição matemática ou é, de alguma forma, a descrição da realidade? Vejamos as interpretações dos físicos.
1.    Interpretação Ondulatória (segundo a ideia de Erwin Schrödinger: objetos quânticos são, na realidade ondas, aproximando da visão de John von Neumann). Antes da detecção, o objeto quântico se desloca como onda, permitindo uma localização, com maior ou menor precisão, ao ser detectado, um comportamento de partícula, portanto. Assim, no deslocamento, tem-se uma onda espalhada e na detecção, tem-se um “pacote” de onda bem estreito, o que resulta na interpretação de partícula. Não há, portando, coexistência do comportamento espalhado com o pacote estreito (de onda ou partícula) [2].
2.    Interpretação Corpuscular (de, por exemplo, Alfred Landé e Leslie Ballentine). O objeto quântico é uma partícula, não existindo onda a ele associada. Neste caso, o padrão de interferência é justificado com base na interação do objeto quântico e o objeto que inicia, supostamente, a possibilidade de verificação da auto interferência (no caso da dupla fenda, o antepara com as fenda) [2].
3.    Interpretação Dualista Realista (originada por Louis Broglie e difundida mais largamente por David Bohm). O objeto quântico é duplamente composto: uma partícula (com características clássicas bem definidas, como trajetória) e uma onda associada (uma onda piloto, guia da partícula). É como se a partícula surfasse a onda de probabilidade. Assim, onde tal onda se cancela, é região proibida à partícula [2].
4.    Interpretação da Complementaridade (de Niels Bohr). O objeto quântico é de caráter absolutamente ondulatório ou corpuscular, nunca ambos simultaneamente. O que é verificado na medição é que esclarece quais dos comportamentos foi adotado [2].

Em relação à função de onda, a equação de Schrödinger, apresentar uma descrição real do objeto quântico e, ainda, se a teoria fornece uma descrição completa ou incompleta da natureza, pode-se adotara seguinte tabela [2]:

Interpretação
Realidade?
Descrição
Ondulatória
Real
Completa
Corpuscular
Epistêmico
Incompleta
Dualista Realista
Real
Incompleta
Complementaridade
Epistêmico
Completa


Considerando a solução ao Paradoxo EPR, o qual supunha que a mecânica quântica não era completa, em princípio, as interpretações Ondulatória e da Complementaridade estão em vantagem.


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[1] Princípio da Superposição: Dados dois estados admissíveis de um sistema quântico, então a soma desses dois estados também é um estado admissível.

[2] Oswaldo Pessoa Jr: Conceitos de Física Quântica Vol 1.

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