Encontra-se nas bancas do nosso
país um bom trabalho, realizado pela editora Abril, sobre: eventos dados como
sobrenaturais, paranormalidade, mediunidade e a percepção geral dos que
testemunham favoravelmente e dos que desdenham os citados temas. Também são abordados
alguns casos e pessoas de destaque na área, histórias de charlatões do meio e
até algumas abordagens científicas. O título desse texto é o mesmo da revista
em foco.
De forma geral, as abordagens são
equilibradas, carregadas de sensatez e visam primar por apresentar neutralidade em relação aos grupo, contra ou a favor, que costumam se digladiar em frentes opostas
sobre o presente tema. Todavia, é pouco provável que os mais extremistas que se
enfileiram nos mencionados grupos apreciem o trabalho, pois, costumeiramente,
acusam os artigos de tendenciosos se não coadunam perfeitamente com suas convicções. Paciência.
Aconselho fortemente a leitura.
Para os que têm alguma simpatia sobre o tema e pouco conhecimento, verifica-se
a oportunidade de ler um material introdutório de nível elevado. Aos que já
acumularam leituras e experiências sobre o tema, no mínimo ter-se-á uma
perspectiva de como abordar o assunto com curiosos.
Em particular, só chamo a atenção para alguns aspectos (que não tiram o mérito do trabalho aqui apreciado).
1. Há
uma grande parte da reportagem diretamente ou indiretamente focada no
espiritismo kardecista. Poderia tem abordado outras filosofias e movimentos que
tem franca ligação com o sobrenatural. É possível que o volume maior vinculado
à doutrina de Allan Kardec venha da organização formal e da ampla simpatia (e
adesão) que o espiritismo goza no Brasil.
2. Há algumas abordagens generalizadas que podem
levar alguns a distorcer informações. Cito, por exemplo, o trecho “... os principais críticos do espiritismo
se tornaram os psiquiatras, que, na virada do século 20, viam na doutrina em
expansão uma herança das crenças africanas...”. É possível que uma parte
dos leitores conclua, desse trecho, que não se tratava apenas de uma postura dominante
(esta é minha interpretação), mas sim um conceito absoluto entre os psiquiatras
do período em tela.
3. No
artigo intitulado “Viagem ao outro lado da vida”, que aborda a experiência de
quase morte (EQM), o texto inicia abordando o singular caso de Pam Reynolds (o
qual já mencionei em contexto similar neste blog). Em especial, lê-se (na Super
Interessante): “A morte clínica de Pam é
aceita por todos os integrantes do corpo médico e está completamente comprovada
pelos dados coletados na cirurgia. Os relatos do que ela diz ter ouvido são
compatíveis com o que foi dito durante a operação, e instrumentos utilizados
para abrir o crânio de Pam – alguns haviam sido recém-criados (e portanto ela
não teria como ter visto antes) – foram descritos com exatidão. (...) A ciência
tem uma boa resposta para as experiências de quase morte[*] (...) tudo isso é
condizente com o aumento de atividade cerebral nos últimos instantes de vida, o
que já foi detectado em laboratório.”. Numa leitura analítica dos trechos aqui
destacados [**]: ou se conclui que “o aumento de atividade cerebral nos últimos
instantes de vida” pode implantar memórias precisas, inclusive de eventos que
podem ser comprovados (excluindo uma aberração estatística favorável aos que
acreditam que a mente não é um mero epifenômeno do cérebro); ou que se deve tomar
a parte como o todo (o aumento da atividade explicando o “implante” de memórias
fantasiosas – luzes, encontro com anjos, aparentes mortos, etc – e ignorar a
existência de partes dos relatos que são verificáveis); ou que há fraude em
todos os estudos (inclusive os que originam artigos científicos) em que são relatados eventos verificáveis, os quais,
investigados, puderam ser comprovados.
[*] Alguém pode ter sua visão
encoberta de determinado trecho de uma rodovia, testemunhar 2 veículos,
deslocando-se em sentido contrário, e, após ficarem ocultados pela barreira,
escutar um forte estrondo. Uma conclusão possível é que os automóveis se
chocaram. Isso é reforçado se minutos passarem e não se avistar os mesmos
saindo da zona da pista que tem a visão encoberta. Todavia, é certo que outros
eventos podem ter ocorrido (os carros estacionados e um dos ocupantes ter usado
fogos de artifício, por exemplo). Com isso, gostaria de alertar aos que afirmam “a ciência tem uma boa resposta para as experiências de quase morte” que deveriam ser mais precisos e transparentes, pois o correto seria citar “a ciência tem uma possível boa resposta para parte do que é relatado nas
experiências de quase morte”, uma vez que “o
aumento de atividade cerebral nos últimos instantes de vida”, evento este
detectado em laboratório, não implica necessariamente em formação de memórias
(salvo ignorância minha sobre algum estudo que demostre tal forçosa
correlação).
[**] Procurei não distorcer o
contexto dos trechos destacados, mas, certamente, aqueles que leram o artigo
abordado aqui poderão apoiar ou contestar minha opinião com propriedade.
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