Se você puser um sapo dentro de uma caixa e
entregar a um cientista, ele pode dizer muitas coisas fascinantes sobre a
criatura. Luigi Galvani, físico italiano de Bolonha, aplicou uma
centelha à perna de um sapo, em 1771, e observou que os músculos se contraíam.
O estabelecimento de uma relação entre a eletricidade e o funcionamento do
corpo abriu um novo mundo. Seria justo dizer que, sem essa simples observação
de Galvani, não existiria todo o campo da neurociência.
Se você pegar outra caixa e colocar um cérebro humano dentro, mais uma vez os cientistas vão descobrir coisas fascinantes, porém, alguns mistérios essenciais não poderão ser explicados; por exemplo, como as imagens são visualizadas no córtex, como uma célula cerebral armazena memória ou como chegamos a nos identificar como indivíduos. Portanto, da perspectiva científica, o cérebro é uma “caixa preta”, um sistema cujo funcionamento interno é refratário a explicações. Quando você põe alguma coisa numa caixa preta, os cientistas só conseguem estudar o que entra e o que sai. O que ocorre dentro da caixa pode ser apenas um tema para especulação.
Mas ainda há um terceiro tipo de caixa com a qual a ciência tem lutado. Nela, você põe a realidade. Quando se pede a um cientista para dizer o que há nessa caixa, ele enfrenta enormes problemas. Por exemplo, ele se debate com a interpretação da maneira estranha como os átomos, os constituintes básicos do mundo físico, estão numa região de sombra entre o real e o irreal. Os espiritualistas confiam no fato de que cada partícula no universo tem a sua fonte no “nada”. Naturalmente, porque é muito difícil relacionar o “nada” com “alguma coisa”, o visível com o invisível. Na verdade, as idas e vindas entre a ciência e a espiritualidade têm sido uma contenda a respeito desse único problema.
Mesmo entre os físicos de mente mais aberta, o mistério da realidade beira o insolúvel. É triste e comovente ler, na historicidade científica ocidental, a aflição dos pioneiros da física quântica quando perceberam que tinham deixado o mundo físico em frangalhos – um mundo antes tão confiável, tranquilizador e disponível aos cinco sentidos. Quando apresentou a sua famosa equação explicando o comportamento ondulatório das partículas, Schrödinger disse que preferia não ter feito a descoberta, pelos sofrimentos e conflitos dela decorrentes. Einstein, igualmente, recusava-se veementemente a aceitar a estranheza de um mundo regido pela mecânica quântica. Para ele, o desmantelamento da certeza era enervante demais. Mas não há dúvidas de que a teoria quântica está correta, até onde vão os cálculos mais pessimistas.
Hoje, uma geração importante de físicos já fez as pazes totalmente com a realidade quântica. Embora se esquive dos aspectos mais inquietantes da teoria, a ciência é regida por fatos. O primeiro deles é que toda experiência ocorre “na”consciência. Isso é mais que um processo cerebral. O segundo fato é que, se houver uma realidade exterior à consciência, nós nunca saberemos o que ela é. Os cientistas reconhecem que nada mais pode ser conhecido fora do cérebro, mas, ao mesmo tempo, acha que, de alguma forma, a ciência está no caminho certo de obter todas as respostas que teremos um dia. Talvez o mais destacado físico a tentar explicar esta discrepância seja Sir Roger Penrose. Ainda que demonstrando perplexidade, ele declarou: “Não acredito que já tenhamos encontrado o verdadeiro caminho para a realidade, apesar dos extraordinários progressos realizados nos últimos dois milênios e meio, em especial, nos dois últimos séculos. Sem dúvida serão necessários novos insights fundamentais”. Do lado da espiritualidade, esses insights vêm existindo há muito tempo. A realidade é consciência pura. Nada existe fora dela. Seus efeitos abrangem tudo. Não pode haver outra resposta. Para chegar a ela, contudo, a ciência precisa deixar de lado a ilusão de que existe um mundo físico “lá fora” ao qual se apegar. Mas os cientistas, em geral, agarram-se a isso com todas as suas forças, mesmo quando, tentando exemplificar, citam provas em contrário.
Vejo a aflição dos físicos em lidar com a realidade e fico imaginando-os como a tripulação de um barco à deriva, em mares turbulentos, sendo sacudido por fortes ondas. O capitão, gritando para o imediato medir a próxima onda a se chocar com o barco. Os instrumentos acusam tratar-se de uma onda de dez metros de altura. “A que velocidade ela vem em nossa direção?”, brada o capitão, preocupado com a possibilidade de o barco virar. Mas antes de gritar a resposta, a onda arrebenta sobre o barco, e tudo o que a tripulação pode fazer é se agarrar à murada para salvar a própria vida. Se substituirmos uma onda de luz ou um feixe de elétrons pelas ondas do mar, a situação fica bastante semelhante à que Einstein e seus colegas enfrentaram quando observaram a realidade quântica. Assim como o imediato, eles podiam medir a massa, a carga e o spin, imobilizando a realidade física, no meio do processo, e descrevendo o que era possível descrever. Enquanto isso, as ondas continuavam a bater violentamente no barco: a realidade está em movimento perpétuo, não espera por ninguém!
Sir Roger Penrose entendeu como a realidade não é “manejável”, ao dizer: “Alguns observadores ainda podem manter a perspectiva de que a própria estrada é uma miragem. Outros talvez tenham a impressão de que a noção de realidade física, com uma natureza verdadeiramente objetiva, independente de como optemos por vê-la, é um sonho em vão”. Parece que a ciência não percebe a ambivalência destas questões. “Esqueça a realidade. Cale a boca e faça os cálculos”, é tudo o que os cientistas sabem dizer. Mas a realidade não cala a boca, e a torturante verdade é que o seu conceito de senso comum sobre o mundo físico já se revelou um barco furado.
Mas, “o que é a realidade fundamental?”
O crédito deste artigo vai para "Breno - O Deísta", ao qual cedeu gentilmente o uso do texto.
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