Parte 1
Introdução
Poderia
se atribuir a um “capricho” do acaso se encontrássemos uma formação de pedras
que configuram, digamos, 20 montes distintos enfileirados e, ainda, que cada um
deles contivesse rochas em quantidades múltiplas de 3 numa sequência crescente?
Suponha que um só apostador, marcando no volante só seis números por sorteio,
ganhasse por cinco vezes seguidas a mega-sena [1]: esta possibilidade é menor
do que uma em 1038 (um seguido de 38 zeros) [2].
Em
ambos os casos, se tomados como reais, é improvável que alguém de inteligência
mediana (ou, até, abaixo), aceitasse que se contou com um golpe de sorte. Iríamos
inferir que alguém arrumou as pedras na sequência correta, no primeiro caso
apresentado, e que “se direcionou” o concurso para o apostador “vidente”.
É
interessante observar que, em nenhum dos dois casos, as leis naturais, físicas,
foram violadas. O que ocorreu foi: direcionamentos deliberados para se atingir
um fim (mesmo que com possível violação de leis criminais, no segundo caso).
Pode-se,
contudo, buscar como isso ocorreu, ou seja, o mecanismo utilizado para tais resultados
verificáveis. Quanto mais engenhoso e robusto contra falhas, maior inteligência
atribuiríamos ao autor do mecanismo e do projeto de direcionamento como um
todo. Aliás, tem-se, assim, uma amostra da capacidade intelectual (ao menos
específica) de uma mente: a maneira pela qual um projeto é desenvolvido e as
soluções aos problemas eventuais que são dadas (ou mesmo a incorporação de auto
corretores no corpo da execução do projeto, de forma a se atingir um
fim especifico).
Essa
foi um exercício útil para, após mostrar alguns estudos e constatações, fechar
este texto com uma analogia.
1. Sintonia
O
leitor familiarizado com a física, sobretudo com os problemas coligados a
origem do nosso universo e das leis físicas que o regem, sabe que é necessário
um ajuste muito preciso, uma sintonia fina, de determinadas constantes para que
as forças que conformam o universo resultem em condições nas quais se possa
haver vida (e inteligente a ponto de chegar a notar tal ajuste) conforme a
conhecemos (ler, neste blog, o texto "Sintonia Fina").
O
físico Brian Green (em “O Tecido do Cosmo”) cita o problema da densidade crítica (quantidade de massa
por volume pós Big-Bang): uma diferença de 0,01% (uma parte em 10 mil) após um
segundo do Big-Bang, levaria, hoje, a 0,00000000001 da densidade crítica
(supressão de uma parte em 1011). Pelo universo observado hoje,
a densidade um segundo após o Big-Bang teria sido extremamente próxima a da
densidade crítica.
Mas
esse é um ajuste grosseiro, se comparado ao do próximo exemplo. Sir Roger
Penrose (O Grande, O Pequeno e a Mente Humana) pergunta (e responde em
seguida): “Qual é a probabilidade de que, puramente por acaso,
o Universo tivesse uma singularidade inicial que se parecesse mesmo remotamente
com o que é? A probabilidade é de menos de uma parte em 10 elevado a 10123
“ (o número um seguido por 10123 zeros [3]).
2. Vida
John C Lennox (Por que a Ciência Não Consegue
Enterrar Deus) mostra que as possíveis combinações dos 100 aminoácidos, da
menor proteína com função biológica conhecida, totalizam em 10130
possibilidades, das quais “uma pequena
parte delas terá importância biológica”. O neoateu Richard Dawkins, aclamado por
muitos ateus, reconhece a improbabilidade do mero acaso favorecer a evolução: “É esmagadora, gritantemente, absolutamente
óbvio que, se o darwinismo fosse realmente uma teoria do acaso, ela não poderia
funcionar”. Há outras citações do gênero entre pesquisadores.
No
entanto, Dawkins (O Relojoeiro Cego) tentou uma saída para a sinuca: postulou a
divisão do processo em “pequenas partes
controláveis”. Na leitura dessa proposição, verifica-se a necessidade de um
controlador e de um objetivo (tais características objetivas e o controlador
seriam gerados ao acaso?). Lennox, na obra já citada, demonstra que a
probabilidade, mesmo com um “revisor” e “objetivo”, ainda apresenta
probabilidade irrisória. Sobre o artífice proposto por Dawkins, Lennox faz uma
citação de David Berlinski: “Todo esse
exercício é [...] uma façanha de auto-engano. Uma frase-alvo? Iterações que se
parecem com o alvo? Um computador ou um macaco chefe que mede a distância entre
o fracasso e o sucesso? Se as coisas são cegas, como representar o alvo, e como
avaliar a distância entre os alvos e as frases geradas ao acaso? E quem fará
isso? O macaco-chefe? Como explica-lo? O mecanismo do design deliberado,
expurgado pela teoria darwinista no nível do organismo, reapareceu na descrição
da própria seleção natural, um exemplo vívido do que Freud quis dizer quando
falou do retorno do que foi recalcado” [4].
3. Proposições
Note
que há proposições básicas na física. Cito:
1) As leias da física são idênticas para
todo referencial (ou seja, em qualquer parte do universo, valem as mesmas leis);
2) O universo é racional, e tal
racionalidade é inteligível pelo homem;
3) As leis naturais são descritas,
modeladas, por uma criação abstrata humana: a matemática.
Explico
para quem não está familiarizado com essa ciência exata.
Em
um universo em que as leis físicas variassem de acordo com a região escolhida,
como fazer considerações da formação do universo e das leis (ou da lei) que o
rege? Qual delas valeria? Valeriam nas condições próximas do momento inicial?
Não haveria estudo da física (nos moldes atuais), se não fosse o pressuposto 1
(nem, tão pouco, arriscaríamos lançar satélites interplanetários de
exploração).
Além
disso, por qual motivo a construção básica do universo deve ser racionalmente
compreensível por alguma inteligência, particularmente pela humana? Sem
apostarmos nessa suposição, não haveria motivo para investigar a natureza e
postularmos leis para prevermos resultados: estudamos o cosmos por supormos
sermos capaz de o entender.
Por
fim, qual a validade de modelar matematicamente as leis naturais se não
entendêssemos que isso é perfeitamente possível? Talvez tenha sido mero golpe
de sorte usar um modelo desse tipo inicialmente, mas como explicar que
funcionam como uma precisão avassaladora [5]?
Albert
Einstein, diante desse quadro, expressou: “O que é mais incompreensível é que o universo é compreensível”.
Conclusão
Não
vamos tirar o mérito da ciência. Reconheçamos que a mesma vem avançando,
iluminando lacunas, apresentando respostas para o que era tido como insolúvel e
de funcionamento, para alguns, “miraculoso”.
A
ciência é a melhor forma disponível para entendermos como o universo foi gerado
e funciona.
Assim
sendo, não espanta que venha a conhecimento acadêmico as leis (ou a lei, se forem
unificadas as conhecidas hoje) da natureza que elucidem como todas as
improbabilidades e precisões foram completamente dominadas e o processo
direcionado, mostrando, então, uma objetividade e, em consequência, projeto de
inteligência singular.
Ora,
se não duvidamos, nas comparações em analogia ao que é citado na introdução
deste texto, que há objetividade e inteligência deliberada para se chegar nos
resultado que ilustrei (montes de pedras e sorteio da loteria), por qual
motivo, além de preferência por uma crença individual a revelia da indicação
dos fatos, pode-se negar uma objetividade e planejamento na construção do
universo?
Lennox
pergunta se o conhecimento e compreensão da mecânica de um automóvel em seus
mínimos detalhes implicam na descrença de que o veículo tem um projetista (ou
uma fábrica que o monte e essa com um projetista, etc); ou, ao contrário, se é
mais provável que se afira a genialidade do projetista do automóvel pela
qualidade daquilo que constatamos em seu funcionamento.
[1]
O cálculo da probabilidade de acerto das seis dezenas sorteadas é realizado por
meio de uma combinação simples dos sessenta números, que compõem o universo de
sorteio, tomados seis a seis. Tem-se, então, “50.063.860
(cinquenta milhões sessenta e três mil oitocentos e sessenta) modos diferentes
de se escolher os seis números de 1 a 60” (http://www.brasilescola.com/matematica/chances-ganhar-na-mega-sena.htm).
[2]
O corpo humano adulto tem cerca de 60 trilhões de células (http://super.abril.com.br/saude/corpo-humano-expansao-439301.shtml),
mas arredondemos para 100 trilhões,
1014, a fim de facilitar uma comparação. Para tal, também
consideremos a Terra com 10 bilhões de pessoas, 1010. Nessas
condições enunciadas, é mais fácil encontrar uma só célula, específica, de
uma única pessoa, considerando o universo de escolha como 100 trilhões, 1014,
de réplicas do nosso planeta, do que acertar as cinco vezes seguidas na
mega-sena.
[3]
Esse número é maior do que a quantidade de partículas estimadas existente no
universo visível, segundo Penrose (uma estimativa, em http://www.redepsi.com.br/portal/modules/newbb/viewtopic.php?topic_id=423,
com cálculo passo a passo, é de 1,2 1079).
[4]
A história do macaco-chefe e da frase alvo decorre da comparação da ação
probabilística do acaso na biologia com a “atividade” descrita pelo matemático Gian-Carlo Rota (http://es.wikipedia.org/wiki/Teorema_de_los_infinitos_monos):
“Se o macaco conseguisse dar um toque no
teclado a cada nanossegundo, o tempo esperado até ele datilografar toda a peça
‘Hamlet’ é tão longo que a idade estimada do universo é comparativamente
insignificante [...] não é um método prático de se escrever peças”. A
comparação é feita em termos da natureza, num processo cego ao acaso, produzir
as façanhas que levam a vida. Daí, Dawkins eleger frases pequenas e
intermediárias (frases alvo), sob supervisão, esta com função de alertar quando
uma letra da frase alvo fosse corretamente digitada (a fim de não mais ser
mudada tal letra), como os “processos controláveis em pequenas partes” para
gerar a obra literária de interesse (além de dispor de um macaco para cada
letra da frase).
[5]
No citado livro de R Penrose, ele declara: “No
primeiro capítulo, sustentei que a estrutura do mundo físico é dependente,
muito precisamente, da matemática [...]
A mecânica quântica
(...) é também uma teoria extraordinariamente precisa (...) existem efeitos
cuja acurácia pode ser calculada em cerca de uma parte em 1011.”.