“Está na moda tornar-se apocalíptico acerca da
ameaça para a humanidade apresentada pelo vírus da aids, pelo mal da
‘vaca louca’ e por muitos outras doenças, mas eu acho natural argumentar
que a fé constitui um dos grandes males do mundo, comparável ao vírus da varíola, só que mais difícil de erradicar. A fé,
sendo uma crença que não se baseia em evidências, é o principal vício de
qualquer religião.”
Será? Acho que o Sr Dawkins, ocasionalmente,
declara sobre aquilo que acha saber (mas não prova saber). Vejamos.
Um cristão não deve ver a ciência como uma
inimiga. Ao contrário, deve perceber a mesma como uma aliada. A ciência estuda a natureza, como as coisas
existem, quais os processos que fazem tudo ser como percebemos. A crença
(cristã) é (ou deveria ser) uma resposta a evidências. Dentre outras
possíveis, cito duas passagens que apoiam essa conclusão: “Mas estes
[sinais] foram escritos para que vocês creiam...” – João 20:31; e
“Pois desde a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu
eterno poder e sua própria divindade, têm sido visto claramente, sendo
compreendido por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são
indesculpáveis.” – Romanos 1:20. O que isso nos diz? Que ao estudar a natureza,
poderemos observar os atributos invisíveis do seu criador, e, além
disso, que o podemos entender por meio destes atributos. Este entendimento
será amplo e irrestrito? Improvável, mas O testemunhará.
Note que, em muitos casos, o reducionismo
científico é ineficiente: certos estudos não levam ao conhecimento do
todo meramente pela análise de partes do mesmo (num paralelismo simples,
estudar os tijolos de uma parede não leva ao conhecimento da arquitetura
da casa). Assim como pela arquitetura da edificação pode ser especificar
a obra, sua técnica de construção e material empregado, a concepção que
é aplicada a Deus deve permitir deduzir como o universo é construído.
Mas este é assunto para a outra postagem.
Voltando ao ponto: assumindo a premissa de que Deus
é onipotente, Ele poderia ter criado o universo de inúmeras formas. Qual Ele usou?
Este é o objeto de estudo da ciência.
Por tais motivos, é fundamental que teístas (sobretudo os cristãos) identifiquem idealismos, crenças, contidos em bases de argumentos que,
em primeira análise, levam a um suposto confronto entre teísmo e
ciência. Isso não é verdadeiro, pois o choque é entre teístas e ateus
(materialista ou naturalista), ou melhor, alguns desses (os militantes).
A ciência é, muitas vezes, usada para dar crédito (desmerecido) a
cosmovisão materialista (militante) em detrimento da cosmovisão teísta.
Essa pretendida alegação e relação não encontra
fundamento.
Vejamos alguns pontos.
Galilei, Copérnico, Newton: todos são teístas,
cristãos (os 2 primeiros até eram amigos de papas). Não raro, são
utilizados para embasar um suposto conflito histórico entre ciência e
teísmo, em particular, cristianismo.
Copérnico e Galileu fizeram citação contrária
quanto ao modelo geocêntrico, o qual era concebido pela Igreja
Católica Apostólica Romana, mas era também o modelo acadêmico científico
da época, os quais assumiam de Aristóteles. Na Carta à Senhora Cristina
de Lorena, grã-duquesa da Toscana, Galileu alega que “foram
os professores acadêmicos que se lhe opuseram de tal forma a ponto de
tentarem influenciar as autoridades eclesiásticas para que elas se
manifestassem contra ele” (segundo J C Lennox, em Por que a ciência não consegue enterrar Deus).
A Igreja Católica Apostólica Romana agiu de forma
a proteger o modelo geocêntrico de Aristóteles (o que não podemos dizer
ser uma atitude digna de palmas), assim como os acadêmicos. Então, não
desvirtuemos os acontecimentos daquela época tentando os travesti com um
imaginário embate entre religião e ciência. O que houve foi um duro e
mortal golpe num paradigma acadêmico da época. Assim, temos uma
ignorância ou uma desonestidade intelectual por parte de quem insinua
tal confronto (ao menos com as bases que criticamos aqui).
Há aqueles que citam Newton e sua teoria da
gravitação como um trunfo da ciência sobre a religião. Contudo,
lendo parte do que Newton nos deixou, verificamos que, em Principia
Mathematica, ele cita: “... a ciência moderna deve ter se originado da
insistência medieval na racionalidade de Deus [...]. Minha explicação é
que a fé na possibilidade da ciência, gerada antes do desenvolvimento da
teoria científica moderna, foi uma consequência inconsciente da teologia
medieval.”.
Peter Atkins (http://pt.wikipedia.org/wiki/ Peter_W._Atkins), professor de
química da Universidade de Oxford, no texto abaixo, reconhece que a ciência
moderna tem um débito histórico com a religião. Como pode ser lido, ele
não é um teísta.
“A ciência, o sistema de crenças muito bem
fundamentado em conhecimentos reproduzíveis publicamente compartilhados,
emergiu da religião. À medida que a ciência foi abandonando sua
crisálida para transformar-se na borboleta de hoje, ela conquistou todo
o terreno.
Não há motivo para supor que a ciência não possa
tratar de todos os aspectos da existência. Somente os religiosos – entre
os quais não incluo apenas os preconceituosos, mas também os mal
informados – esperam que exista um canto escuro do universo físico, ou
do universo experimental, que a ciência não pode nunca esperar
esclarecer.”
Verifica-se, assim, que as alegações de suposto
conflito histórico carecem de fundamento.
No trecho citado de Atkins “Não há motivo para
supor que a ciência não possa tratar de todos os aspectos da
existência”, cabe uma observação de Thomas Nagel, professor de filosofia
e ateu:
“Os propósitos e as intenções de Deus, se é que
existe um deus, e a natureza de sua vontade não são assuntos possíveis
de uma teoria ou explicação científica. Mas isso não implica que não
possa haver comprovação científica pró ou contra a intervenção de uma
causa semelhante não regida por uma lei na ordem natural.”
Richard Dawkins cita:
“Na próxima ocasião em que alguém lhe disser que
algo é verdadeiro, por que não lhe responder: ‘Que tipo de evidência
disso existe?’? E se não houver uma boa resposta, espero que você pense
com muito cuidado antes de acreditar numa só palavra do que está
ouvindo.”
É um excelente conselho.
Posso afirmar que uma corrente alternada gera um
campo magnético associado à mesma. Qualquer cientista da área não
discordará desta afirmativa, pois os estudos eliminaram justificativas
em contrário.
Quando algo é comprovado cientificamente, pode-se
afirmar que se eliminaram justificativas contrárias à comprovação. Qualquer
cientista que tenha conhecimento de tal campo, não irá contrariar a
assertiva declarada.
Vamos a 2 outras citações e a(s) evidência(s) que
as “apoiam”.
Citação 1. Peter Atkins: “A humanidade deve
aceitar que a ciência eliminou a justificativa da crença num propósito
cósmico, e qualquer sobrevivência desse propósito inspira-se apenas no
sentimento.”
Pelas palavras de Atkins, se estiverem
corretas, decorre que nenhum cientista discordará da mesma. Contudo, não raramente, deparamos com citações
como a de Sir Ghillean Prance (http://cienciaecultura.bvs. br/scielo.php?pid=s0009- 67252007000200007&script=sci_ arttext):
“Acredito há muitos anos que Deus é o grande
arquiteto por trás de toda a natureza [...]. Todo os meus estudos
científicos a partir daquele tempo confirmaram minha fé. Considero a
Bíblia como minha principal fonte de autoridade.”
Citação 2. Douglas Futuyama (biólogo evolucionista
notável): “Ao juntar a variação não dirigida e sem propósito a processos
desprovidos de inteligência e cegos da seleção natural, Darwin tornou
supérfluas as explicações espirituais ou teológicas dos processos da
vida”.
De forma análoga à anterior, se as palavras de
Futuyama estiverem corretas, decorre que nenhum cientista discordará da
mesma. O professor da Universidade de Vienna Gerd Müller
diz que:
“Apenas alguns dos processos descritos [...] são
tratados pela teoria canônica neodarwinista, que se preocupa
principalmente com a frequência de genes em populações e com os fatores
responsáveis pela variação e fixação delas. Embora, no nível fenotípico,
ela trate das modificações de partes concretas, a teoria não é concebida
para explicar nem a origem das partes, nem a organização morfológica,
nem a inovação. No mundo neodarwinista, o fator que motiva a mudança
morfológica é a seleção natural, que pode explicar a modificação e a perda de partes. Mas a seleção não tem capacidade
inovadora: ela elimina ou mantém o que existe. Os aspectos geradores ou
ordenadores da evolução morfológica estão assim ausentes da teoria
evolucionista.”
Desta forma, retomando a citação inicial do
ateu R Dawkins “se não houver uma boa resposta, espero que você
pense com muito cuidado antes de acreditar numa só palavra do que está
ouvindo”, mostrou-se que não há evidencias em dadas citações de
militantes ateus.Também espero que sigam o conselho de Dawkins (inclusive o mesmo).
Façamos 2 apontamentos de evidência pró teístas.
Richard Swinburne, filósofo:
“Não estou postulando em ‘Deus das lacunas’, um
deus só para explicar as coisas que a ciência não explicou. Estou
postulando um Deus para explicar por que a ciência explica; não nego que
a ciência explique, mas postulo Deus para explicar por que a ciência
explica. O próprio sucesso da ciência demonstrando-nos como o mundo
natural é profundamente ordenado nos apresenta fortes razões para
acreditar que há uma causa ainda mais profunda para essa ordem.”
Com isso, Swinburne pode alegar que responde
Albert Einstein quando o mesmo comenta: “A coisa mais incompreensível
acerca do Universo é que ele é compreensível”.
Sir Roger Penrose, matemático, comenta sobre a
possibilidade de existência do nosso universo:
“Tente imaginar a fase espaço... do universo
INTEIRO. Cada ponto dessa fase de espaço representa um diferente modo
possível do começo do universo. Precisamos imaginar o Criador segurando
um “alfinete” – que deve ser colocado nalgum ponto da fase do espaço.
[...] Cada posicionamento diferente do alfinete apresenta um
universo diferente. Ora, a precisão necessária para o objetivo do
Criador depende da entropia do Universo que é assim criado. Seria
relativamente “fácil” produzir um universo de alta entropia, pois nesse
caso haveria um grande volume de fase de espaço disponível a ser
atingido pelo alfinete. Mas para começar o universo em estado de baixa
entropia – para que haja de fato uma segunda lei da termodinâmica – o
Criador precisa visar a um volume muito menor de fase de espaço. Quão
diminuta deveria ser essa região para que daí resultasse um universo
muito parecido com aquele no qual nós de fato vivemos?”
Seus cálculos levaram a necessidade de precisão de uma parte
em 10 elevado a 10 elevado a 123 (o número 10 elevado a um número que é dado pelo 1 seguido de 123 zeros). Atualmente, este
número é maior do que o número de partículas estimadas existentes no
universo. Em termos percentuais, isso equivale a 0,0...01% de chance de acertar o objetivo, onde os "três pontos" substituem a seguinte quantidade de zeros: 10 elevado a 123 subtraído de 5 unidades.
Encerrando por aqui, lembro que apenas partes dos
ateus, e um universo ainda menor de cientistas, são alvos das críticas
aqui dirigidas. Espero, neste texto, ter mostrado que
fanatismos por crenças pessoais não são exclusividades de religiosos.
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